O país se encontra hoje numa fase de transição e de reorientação, caracterizada pela liberalização da economia e a privatização das empresas públicas. Essa fase já está trazendo melhorias na produtividade e mais competitividade na economia. Por outro lado, o governo engajou-se numa firme política de investimentos, que atingem hoje 16,4 % do PIB, dos quais 10 % provenientes do setor privado.
O desenvolvimento econômico da Costa do Marfim é baseado na agricultura. Esse setor representava em 1960 90 % do PIB e empregava 80 % da população. Hoje, o setor contribua ainda por 33 % do PIB, 66 % da receita das exportações e dois terços dos empregos. Só o café e o cacau constituam 17 % do PIB e mais da metade do valor total das exportações. A Costa do Marfim é o primeiro produtor e exportador mundial para o cacau, e o quarto para o café. No entanto, a extrema dependência dessas culturas aos preços internacionais fez com que o governo incentivasse o desenvolvimento de novas atividades.
No setor da pecuária e diante do problema de abastecimento em proteínas animais, a Costa do Marfim é obrigada a importar grandes quantidades de carne. Portanto, um amplo programa visando a desenvolver o potencial nacional foi lançado.
A crescente importância da indústria é comprovada pela sua participação no PIB, que passou de 4% em 1960 para os atuais 26%. A primeira década após a Independência foi caracterizada por uma política de importações de substituição que resultou na criação de grandes empresas marfinenses tais conservarias de atum, fábricas de cerveja e de açúcar, processadoras de café, cacau e óleo de palma, madeireiras, refinarias de petróleo, indústrias químicas, fábricas de sabão, de fertilizantes e de tintas, e enfim indústrias mecânicas e elétricas.
A Costa do Marfim conta hoje com 1.600 indústrias, cuja 240 de grande porte, ou seja, com investimentos brutos acumulados superiores ou iguais a US$ 400 mil, e 151 de pequeno e médio porte, com investimentos inferiores a US$ 80 mil.
Tutorado e Hospitalidade
Na sua história, a Costa do Marfim sempre foi reconhecida como um país de hospitalidade e fraternidade, haja vista a existência de poderosas instituições costumeiras, cujo maior exemplo é o tutorado, que garantia a todos, inclusive aos estrangeiros, o acesso à terra, bem considerado inalienável.
A existência do tutorado, associada à necessidade de mão-de-obra para as culturas de exportação e o crescimento econômico da Costa do Marfim, nos anos que vão de 1960 a 1980, tem servido para explicar a forte presença estrangeira no país, principalmente de imigrantes originários do Burkina Faso, e o deslocamento interno de algumas populações para terras com potencial agrícola para as culturas cacaueira e cafeeira.
Como a relação entre populações autóctones e estrangeiras na ocupação e exploração da terra foram e continuam sendo fontes de alguns problemas, ainda que os envolvidos estivessem sempre inclinados às soluções pacíficas, baseadas nos direitos costumeiros de cada sociedade, em 1958 os Agni Sanwi editaram um código fundiário com regras específicas sobre a concessão de terras para exploração agrícola de estrangeiros (D'Aby, 1960, p.174-175) afirmando que:
• Todo estrangeiro que recebe a hospitalidade na casa de um chefe tradicionista ou na casa de qualquer outra pessoa, na qualidade de hóspede, poderá obter deste o usufruto de uma parte da terra de direito da cadeira onde ele vive, por meio do pagamento exigido costumeiramente.
• Caso o estrangeiro faleça sem que tenha quitado os pagamentos exigidos, o chefe ou o seu tutor terá direito à plantação e aos frutos da terra explorada por ele e cujo usufruto lhe tinha sido concedido.
• Se o falecido tiver se casado com uma mulher da família que o hospedou, os bens poderão ser transferidos para a viúva ou para os seus filhos.
• Se um de seus parentes vier viver com ele e trabalhar na mesma família que o hospedou, terá direito à metade dos bens produzidos no campo, desde que esteja residindo na localidade sob a guarda daquela família há pelo menos seis meses.
• O chefe de linhagem e o rei podem autorizar que certos estrangeiros ocupem extensões definidas de terras em localidade Agni por tempo indeterminado ou por um período de nove meses.
• Antes do estabelecimento formal do contrato, o requerente deverá indicar por escrito a verdadeira destinação que dará à terra solicitada; deverá pagar os impostos da corte ou da coletividade local; deverá respeitar as obrigações para com os usos e costumes do reino, salvo naquilo que diz respeito à família e a sucessão, e não poderá alienar as plantações em favor de terceiros. (D'Aby, 1960)
O código fundiário Agni Sanwi, além de ser revelador do direito costumeiro que regula o acesso à terra por meio das cadeiras ancestrais e das relações entre autóctones e estrangeiros, também trata das questões da família e da sucessão, reconhecendo que o "hóspede", sendo um estrangeiro, possui seus próprios usos e costumes.
Assim, durante anos, ainda que alguns conflitos entre autóctones e estrangeiros envolvendo o acesso à terra fossem verificados, essas instituições serviram à manutenção da solidariedade comunitária (familiar, de linhagem e de aldeia), envolvendo autóctones e estrangeiros.
Parte das explicações para o tutorado está no fato de que os Akan, tendo imigrado para o território da atual Costa do Marfim no século XVIII, não se consideram os verdadeiros "senhores donos da terra", e só a ocupam por terem conseguido a devida autorização dos Boson (elementais da terra, dos rios, das florestas etc.) por meio de pactos propiciatórios.
A convulsão política e social, cujos exemplos mais memoráveis são o golpe de Estado ocorrido em dezembro de 1999 e a atual crise com a divisão do país em duas porções (norte e sul), é reveladora da grande desestabilidade vivida em setores importantes da Costa do Marfim. O golpe abriu novas feridas sociais e aprofundou outras já existentes, nascidas da crise econômica dos anos 1980 e agravadas pela epidemia do HIV/AIDS.